Sexta-feira, 7 de Outubro de 2011

A ameaça chinesa

O crescimento médio do PIB nos últimos 10 anos foi de 1,7% nos EUA, de 1,1% na Zona euro e de 10,5% na China. E, no final de 2010, atribuindo ao conjunto o valor de 100, os EUA valiam 41, a Europa 31 e a China 28. Projectemos estes números até 2030, admitindo que americanos e europeus crescem à mesma taxa e os chineses apenas metade disso: no mesmo conjunto de 100, o peso é agora de 45 para China, 33 para os EUA e 22 para a Zona euro.

O raciocínio é especulativo e, no caso da China, admito que subavaliado. Mas dá uma ideia da ameaça a que estamos sujeitos, a um prazo não muito longo. Se olharmos para os modelos de desenvolvimento destes países, vemos que nada têm em comum: a Europa gasta mais ou menos o que produz; os Estados Unidos gastam mais e endividam-se; e a China, poupadinha, acumula reservas colossais. São estas reservas que no futuro vão fazer a diferença.

Vale a pena quantificar. De acordo com o FMI, as reservas chinesas atingem cerca de $3,5t - 3,5 triliões de dólares na escala americana e quase 25% do PIB dos EUA. Se aplicadas na aquisição de bens e serviços, estas reservas dariam para comprar toda a produção anual de petróleo; com apenas metade comprar-se-iam as dívidas soberanas de Espanha, de Portugal, da Irlanda e da Grécia; e menos de um décimo chegaria para comprar Manhattan.

Num mundo interdependente à escala global, em que cada país de per si beneficia tanto mais quanto mais forte for o conjunto, o normal seria que a China se disponibilizasse para comprar dívida soberana aos países da Zona euro. Mas nunca o fez. E, do meu ponto de vista, ainda bem: sentir-se-iam tranquilos se a Europa, um universo democrático, fosse "vendida" a um outro cujos líderes perseguem os opositores e violam os direitos humanos?

Falta a destrinça entre ser rico e ter muito dinheiro. Que a China tem muito dinheiro provam-no a taxa de crescimento e as reservas acumuladas. Mas também os 1.350 milhões de chineses que estão por detrás disso. O confronto com o Japão, que tem um PIB equivalente, é sintomático: com 1/10 das pessoas, ele tem um rendimento ‘per capita' 10 vezes superior. Ou seja, o Japão é um país rico e a China não. Mas não tenhamos ilusões: na hora da verdade é a força do dinheiro que vai prevalecer.

A ameaça está aqui.

 

CHINA IMPERIAL

 

Do crescimento fabuloso...

(PIB real, 2000=100)

 ...às reservas colossais

(Reservas, $triliões*)

  

Com taxas de crescimento modestíssimas, tanto na Zona euro (1,1%) como nos EUA (1,7%), os últimos 10 anos foram para ambos uma década perdida. Mas esta inoperância foi compensada pela China, com uma taxa de crescimento média superior a 10%, o que permitiu sustentar a economia mundial. Não satisfeita com isso, a China ainda se deu ao luxo de acumular reservas de $3,5t - quase 25% do actual PIB americano.

Fontes: FMI, Eurostat.

____

Daniel Amaral, Economista
d.amaral@netcabo.pt

 

Comentários:

 

RG , | 07/10/11 12:02
Mas será que ainda não entendemos que a China já faz o que quer. São os produtores do Mundo.
Em 2030 estamos todos entregues aos chineses. Os EUA e a Europa estão a entrar em recessões atrás de recessões.
É como o tipo que é Rico e gasta que nem um doido, ou um tipo que está a enriquecer e nada gasta. Quem será que fica bem no final.

Realista , Porto | 07/10/11 11:29
Cortaram-me o comentario. Vou fazer segunda tentativa. Concordo com o artigo e os 3 comentarios. Mas penso que o autor devia falar no desiquilibrio das paridades cambiais para explicar a situação. Ha meia duzia de anos tÍnhamos 1 Euro = 1 Dolar. Hoje temos 1 Euro = 1,4 Dolares. Como é possivel conseguir ganhos de productividade em 6 anos que compensem esta valorização do Euro?. Por outro lado o yuan tem estado sub valorizado. Toda a gente reconhece isso. Não é só o espírito de trabalho dos chineses que explica o seu crescimento. HA UM PROBLEMA CAMBIAL QUE TEM QUE SER RESOLVIDO.


LOPES CARLOS , Bélgica | 07/10/11 07:21
1. Artigo interessante e bem fundamentado , como sempre.
2. Saudo o comentário do Sr. Dr. João Santos Lucas, que escreveu muito e bem sobre a Asia e sobre RP CHINA.
3. Com as Grandes Transformações , o Senhor Presidente DENG abriu a RP CHINA a uma via de grande progresso economico e social. Os Presidentes seguintes executaram as fases seguintes e HOJE a RP CHINA é um dos Motores da Economia Global.
4. Mesmo publicações e Autores "politicamente correctos" ( ver Foreign Affairs e B-H Levy ) reconhecem o ascenso da RP CHINA e o seu real papel no Mundo ...e dentro dos EUA.
5. Como os Povos da Grécia e Portugal , o Povo Chinês é um Povo bom e barulhento , mas pacifico. Não foram os Chineses que desencadearam uma GUERRA SANGRENTA PARA IMPOR O OPIO . Não são os Chineses que estão NESTE MOMENTO PRECISO a envolver outra potência com uma carissima rede de bases militares. Não são os Chineses que fazem milhares de bombardeamentos em diversos Paises e depois vendem a "reconstrução".

Joao Santos Lucas , Singapura | 07/10/11 04:37
As elites portuguesas, incluindo os economistas, ignoraram nos ultimos cinco anos o crescimento da China. Nao terei sido o unico que em artigos quinzenais, durante cerca de tres anos, chamou a atencao para o fenomeno nas paginas do Diario Economico .
Vale a pena voltar a recordar que cerca de 50% dos produtos exportados pela China sao produzidos por empresas americanas e europeias na China.
O maniqueismo na analise economica e pernicioso. O Mundo precisa de mais integracao entre as economias asiaticas e as economias ocidentais. A paz mundial o requer.
Torna-se obvio que a esquerda portuguesa condena a China sem perceber o que se passa. Precocupa-se com condicoes de producao na China actual que foram comuns no periodo de desenvolvimento industrail da Europa e da America e subvalorizam o facto da pobreza estar a ser erradicada da China de forma consistente e irreversivel. Falta em Portugal um debate serio sobre a Asia. Preconceitos nao ajudam a tomada de decisoes racionais. 
A verdadeira ameaça , | 07/10/11 01:17
Vem dos EUA e não da China. Os chineses trabalham exaustivamente, os américas roubam exaustivamente, eis a enorme diferença. E mais, para além dos roubos e da produção de armamento de guerra, que mais eles sabem fazer com qualidade? Nada. Absolutamente nada.
publicado por ooraculo às 17:58
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